Projeto contra desperdício na indústria de pescado


fonte: acessenoticias


SÃO PAULO (FAPESP) – De acordo com pesquisa realizada em 2010 pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), cerca de 1,3 bilhão de toneladas de alimentos por ano são desperdiçadas no mundo, o que equivale a um terço do total produzido pela indústria alimentícia.


Na colheita da matéria-prima, nas etapas da produção, no transporte e na mesa dos consumidores, são vários os momentos em que se desperdiça comida. Para diminuir o desperdício, no processo produtivo de alimentos sobras são reutilizadas para gerar outros produtos e diminuir a quantidade desperdiçada nessa etapa.



Eunice Yamada, pesquisadora científica do Centro de Tecnologia de Carnes do Instituto de Tecnologia de Alimentos (CTC-Ital), alerta que a indústria brasileira processadora de pescado não tem sido inovadora como as de carne bovina e de aves, que, segundo ela, fazem melhor uso da matéria-prima e desenvolvem variadas formas de utilizar restos para a fabricação de outros produtos alimentícios.



“O pescado tem cerca de 20% a 25% de carne comestível e 75% a 80% de resíduo recuperável, que são predominantemente vísceras, cabeças, ossos, pele e escamas. Alguns desses restos são usados como farinha de peixe ou fertilizante. No entanto, a maioria é descartada, o que pode resultar em poluição ambiental e perda de subprodutos que agregariam valor à produção”, afirmou.



A pesquisadora, em parceria com a empresa Royal Fish, localizada em Jundiaí, no interior de São Paulo, e com Alexandre Hilsdorf, professor e pesquisador do Núcleo Integrado de Biotecnologia da Universidade de Mogi das Cruzes, desenvolve o projeto de pesquisa “Agregação de valor ao processo de industrialização do híbrido da tilápia vermelha (Oreochromis niloticus)”.



Aprovada em chamada de propostas do programa PAPPE-PIPE III, apoiado pela FAPESP e pela Finep, a pesquisa pretende reaproveitar resíduos do processo de filetagem da tilápia vermelha para a fabricação de subprodutos alimentares.



O projeto prevê que restos como cabeças, vísceras e espinhaço serão utilizados para a produção de ração animal. “Do espinhaço, será obtida a polpa – carne mecanicamente separada do pescado – para a fabricação de surimi [base proteica originada do pescado e encontrada em produtos da alimentação humana]”, contou Yamada.



“Com a polpa e os músculos picados serão desenvolvidos produtos reestruturados. Aparas da filetagem poderão se tornar cubos de tilápia em conserva no mercado”, disse.



“O aproveitamento das sobras da filetagem para a obtenção de outros produtos alimentares permite racionalizar o uso da matéria-prima, o que, consequentemente, reduz custos da produção. Além disso, pode ampliar a gama de produtos de tilápia ofertados no mercado e incentivar o consumo dessa fonte proteica de alta qualidade”, disse Yamada.



De acordo com Hilsdorf, além de gerar subprodutos do peixe, o projeto pretende realizar testes sensoriais que avaliarão a aceitação da tilápia vermelha pelo consumidor brasileiro.



Yamada atenta para a complexidade do trabalho. “Utilizar e até mesmo descartar esses resíduos é uma tarefa complexa, pois sua estabilidade biológica é inadequada e sua natureza é potencialmente patogênica, com alto teor de água, potencial para rápida auto-oxidação e elevado nível de atividade enzimática”, explicou.



Tilápia melhorada geneticamente



Apesar de o consumo de pescados ter aumentado quase 40% no Brasil nos últimos sete anos, ainda está abaixo da média mundial e do que é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo dados divulgados em setembro de 2011 pelo Ministério da Pesca e Agricultura, o brasileiro consumia aproximadamente 6,5 quilos de pescado por ano em 2003 e passou a consumir pouco mais de 9 quilos em 2010. A OMS recomenda o consumo anual de 12 quilos por habitante.



Antes de partir para a fase de agregação de valor ao processo de filetagem da tilápia vermelha, Hilsdorf realizou diversos cruzamentos entre duas variedades de tilápia nilótica, uma vermelha mutante e outra selvagem preta, para adquirir uma linhagem de tilápia melhorada geneticamente.



Após quatro anos de trabalho, realizados com apoio da FAPESP por meio do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), Hilsdorf e equipe conseguiram obter o híbrido com as características que desejavam.



“Queríamos uma variedade que tivesse a coloração vermelha da Red Stirling [linhagem oriunda da Escócia] e o excelente desempenho em campo [tamanho maior] da selvagem preta, encontrada no rio Nilo, no Egito”, detalhou.



O projeto de pesquisa “Avaliação genética e zootécnica de duas variedades de tilápia nilótica para o estabelecimento de um programa de produção massal de um híbrido” também foi realizado em parceria com a Royal Fish.



A empresa hoje produz o híbrido que, segundo Hilsdorf, leva vantagem em relação à variedade de tilápia vermelha predominante no Brasil, a saint peter, devido ao seu desempenho em campo.



Agora, depois de conseguir o produto tecnológico, a parceria entre a Royal Fish e Hilsdorf ganha mais um colaborador, o Ital, por meio de Yamada e equipe, para realizar pesquisas acerca dos procedimentos de filetagem da variedade, visando agregar valor a esse processo produtivo.

0 comentários:

Postar um comentário